O que significa o término de um processo analítico?

Existe “alta” na análise? O sujeito sai curado? Curado do quê? 

O processo de análise é algo que acontece na transferência, que segundo Freud é um tipo de amor, o amor de transferência. A transferência é um deslocamento afetivo que cria um novo fato, construindo um passado no presente. A transferência é um passo necessário para o processo analítico, um instrumento motor da direção da análise. Essa transferência pode se configurar de diversas maneiras.  

Uma vez que a transferência implica o analista, a questão é saber de que maneira este responde ao apelo do dito amor do paciente. Isto é, como o analista responde a esse lugar que lhe é dado pelo paciente? 

Lacan, diferentemente de Freud, não acha que essa transferência precisa ser interpretada e comunicada ao paciente. O risco dessa manobra de interpretar a transferência está, portanto, em manter a análise na prevalência do simbólico subordinada ao discurso do mestre. Em outras palavras: do analista assumir um lugar de mestre, de um modelo a ser seguido. Não se deve estabelecer relações de poder entre o profissional e o paciente. O discurso do paciente deve ocupar um lugar de destaque para que ele consiga alcançar respostas às suas próprias questões. 

Logo, “o objetivo de uma análise é ajudar o analisando a ganhar uma maior familiaridade com o seu mundo interno, com o seu universo psíquico. Nesse sentido, a análise é interminável, não há interrupção. Não se espera que o analisando saia “curado”, que saia sem “atuar” (Yeda Saigh).

Isto é, o processo analítico enquanto um conhecimento do inconsciente, enquanto um processo de análise de si, não se finda. Não há cura do próprio inconsciente. É claro que pode e, algum sentido é desejavel que haja cura de sintomas, mas esse não é o objetivo principal de uma análise. Geralmente isso é o que leva alguém até a análise.

“Mas não podemos fugir de nós mesmos, contra o perigo interno não há fuga possível” Freud ([1937] 2021, p. 342).

Mas então, quando um processo analítico chega ao fim? 

Ao meu ver, a análise chega ao seu fim quando o analista vai deixando se ser um “objeto” idealizado do analisante/paciente, quando esse vai podendo tecer críticas em relação ao analista e quando se percebe precisando cada vez menos desse “objeto idealizado”.

Em palavras mais simples, quando o analista deixa de ser necessário e passa a ser cada vez menos importante. Isto é, quando nos tornamos desimportantes aos nossos pacientes.

Isso não quer dizer que não exista um afeto e até mesmo um carinho pelo analista, mas o sujeito percebe que pode continuar a caminhar sozinho.

É evidente que ainda haverá questões, o inconsciente não se finda. Esse analisando pode vir a procurar o mesmo analista outras vezes ou mesmo um outro analista.

“O que termina é a relação analista-analisando, a situação de análise. Término esse que dependerá da história de cada análise” (Yeda Saigh).

Psicóloga e psicanalista Flávia Verceze.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *